A evolução da imagem do Papai Noel – De São Nicolau à Santa Claus

por Gustavo Magnani - Literatortura

O bom velhinho não teve sempre a aparência vermelha e branca com a qual estamos acostumados. Muitas pessoas sabem que essa sua imagem contemporânea foi divulgada pela Coca-Cola no início do século XX, porém, a origem do mito é muitíssimo mais antiga.

O Natal, como muitos também sabem, não corresponde ao dia exato do nascimento do Cristo. A data de 25 de dezembro foi instituída no século IV, no final do período romano, para concorrer com as festividades das Saturnálias, que aconteciam de 17 a 24 de dezembro. Na mesma época, surgiu a lenda que envolve Nicolau, bispo de Mira, nascido na região da Lícia, na Ásia Menor, que teria resuscitado três crianças, se tornando assim seu santo protetor.

A lenda começou a se tornar popular na Idade Média, depois que cavaleiros cruzados trouxeram as relíquias de São Nicolau para Bari, na Itália, em 1087. A partir daí, sua festa começou a ser celebrada todo ano no dia 6 de janeiro. A barba branca que já conhecemos era acompanhada por trajes que carregavam os traços de sua função como bispo, compostos do báculo (cajado com a extremidade curva), a mitra (chapéu pontudo) e um longo manto com capuz. Em algumas partes da Europa, sua imagem com as vestimentas de bispo persistiu até o século XX.

Iluminura representando São Nicolau e as três crianças ressuscitadas no livro de horas Les Heures de Jean Vy et Perrette Baudoche Metz (cerca de 1435 – 1447).



Litografia de Jean-Jacques Waltz, alias Hansi, ilustra a passagem de São Nicolau em Colmar, na França (1938).



A tradição que indica a visita às casas, levando presentes às crianças bem comportadas, já vem dessa época. Os meninos levados, ao contrário, levavam chicotadas ou recebiam pedaços de carvão do Père Fouettard, personagem do folclore natalino francês que acompanhava São Nicolau. Em tradução literal,Père Fouettard significa algo como “Pai Chicoteador”, pois a expressão é derivada da palavra fouet que significa chicote, chibata. Em outros países, o personagem também existia sob outros nomes e sua tradição perdurou por vários séculos.


Ilustração de jornal de 1896 mostrando São Nicolau e Krampus (versão do Père Fouettard) visitando uma família vienense.


Apesar do culto dos santos ter sido suprimido depois da Reforma Protestante, no século XVI, a lenda de São Nicolau persistiu, com particular força no norte da Europa. Inclusive, nesses países, a árvore já possuía um valor simbólico na comemoração do Natal, pois as luzes eram centrais na celebração da data.

Nos Países Baixos, onde seu culto tinha grande importância, era chamado de Sinter Klaas, nome que se transformou em Santa Claus, depois da migração holandesa aos Estados Unidos e à fundação de Nova York, na época Nieuw Amsterdam.

Posteriormente, a população católica associou o patrono das crianças ao menino Jesus, e então o momento de receber os presentes passou a ser na noite do dia 24, véspera de Natal.

A figura moderna do Papai Noel começou a tomar forma no século XIX, sob a pluma de Thomas Nast, um americano nascido na Alemanha. Entre 1863 e 1886, o artista contribuiu para a Harper’s Weekly, criando 33 ilustrações natalinas que deram uma forma única ao personagem, que antes era representado de diversas maneiras no país. Em suas ilustrações, ele frequentemente carregava um cachimbo comprido e fazia alusão aos heróis nortistas da Guerra de Secessão.





Ilustração de Thomas Nast de 1866 que já mostrava diversos elementos que circundam a figura do Papai Noel, tais como a oficina de brinquedos e o livro onde o comportamento das crianças é anotado.



No mesmo século, a ideia de que o Papai Noel mora no polo norte começou a ser difundida. O conceito foi discutido por vários países do norte da Europa, cada um revindicando que o velhinho habitava alguma parte de seu território. Enquanto que para os americanos a casa do Papai Noel continuava sendo no mesmo lugar, os finlandeses alegaram, em 1927, que as renas não teriam alimento no polo norte pela falta de vegetação, e que, na verdade, ele vivia na região da Lapônia, em Korvantunturi. Posteriormente os finlandeses decretaram que a residência do Papai Noel era em Rovaniemi, enquanto que para os noruegueses, o lugar era Droeback, para os suecos, a Guesunda, para os russos, a Sibéria, para os canadenses o Grande Norte, e finalmente, para os dinamarqueses, a Groelândia. Praticamente uma lição de patriotismo!





A imagem definitiva do Papai Noel, como conhecemos hoje, foi disseminada pela Coca-Cola através de uma série de ilustrações de Haddon Sundblom, veiculadas a partir dos anos 30. Prova de como o capitalismo e a globalização podem influenciar e lentamente transformar lendas e símbolos antiquíssimos, além de difundi-los.






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