A hipocrisia do Criança Esperança

Dar com uma mão e pegar muito mais com a outra é indefensável moralmente. Saiba mais sobre a hipocrisia de ações “filantrópicas” como o Criança Esperança

Paulo Nogueira, diário do centro do mundo
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A hipocrisia da Rede Globo / Criança Esperança: programa arrecada menos de 0,5% do que a Receita Federal está cobrando da Globo
Imposto é um dos temas mais quentes do mundo moderno.
Nos Estados Unidos, por exemplo. Barack Obama usou isso como uma arma para atacar seu adversário republicano Mitt Romney. Romney é um homem rico, mas tem pagado bem menos imposto, proporcionalmente, do que um assalariado comum.
Obama o desafiou a publicar o quanto ele pagou nos últimos cinco anos. Se ele fizesse isso, Obama jurou que não tocava mais no assunto. Romney não fez, e se estrepou nas eleições.
No mundo, agora. Um levantamento de um instituto independente chamado TJN mostrou, em 2012, que mais de 30 trilhões de dólares estão escondidos em paraísos fiscais, longe de tributação. Se aquela cifra descomunal fosse declarada, ela geraria impostos de mais de 3 trilhões, considerada uma taxa (modesta) de 10%.
Lembremos. Imposto é chato e ninguém gosta, nem você e nem eu. Mas é com ele que governos constroem escolas, estradas, hospitais etc. Logo, eles são do mais absoluto interesse público.
Agora, o Brasil.
Uma notícia espetacular, a despeito do número esquálido de linhas, foi publicada há algum tempo na seção Radar, de Lauro Jardim, da Veja: a Globo, o Paraíso dos “PJs” está sendo cobrada em 2,1 bilhões de reais pela Receita Federal por impostos que alegadamente deveria recolher e não recolheu.
Segundo o Radar, outras 69 empresas foram objeto do mesmo questionamento fiscal. Todas acabaram se livrando dos problemas na justiça, exceto a Globo. Chega a ser engraçado imaginar a Globo no papel de vítima solitária, mas enfim.
Em nome do interesse público, a Receita Federal tem que esclarecer este caso. É mais do que hora de dar um choque de transparência na Receita – algo que infelizmente o governo Lula não fez, e nem o de Dilma, pelo menos até aqui.
Se o mundo fosse perfeito, a mídia brasileira cobriria a falta de transparência fiscal para o público. Mas não é. Durante anos, a mídia se ocupou em falar do mercado paralelo.
Pessoalmente, editei dezenas de reportagens sobre empresas sonegadoras. A sonegação mina um dos pilares sagrados do capitalismo: a igualdade entre os competidores do mercado. Há uma vantagem competitiva indefensável para empresas que não pagam impostos. Elas podem investir mais, cobrar menos pelos seus produtos etc.
Nos últimos anos, o assunto foi saindo da pauta. Ao mesmo tempo, as grandes corporações foram se aperfeiçoando no chamado “planejamento fiscal”. No Brasil e no mundo. O NY Times, há pouco tempo, numa reportagem, afirmou que o departamento contábil da Apple é tão engenhoso quanto a área de criação de produtos. A Apple tem uma sede de fachada em Nevada, onde o imposto corporativo é zero. Com isso, ela deixa de recolher uma quantia calculada entre 3 e 5 bilhões de dólares por ano.
Grandes empresas de mídia, no Brasil e fora, foram encontrando jeitos discutíveis de recolher menos. Na Inglaterra, soube-se que a BBC registrou alguns de seus jornalistas mais caros, como Jeremy Paxton, como o equivalente ao que no Brasil se chama de “PJ”. No Brasil, muitos jornalistas que escrevem catilinárias incessantes contra a corrupção são “PJs” e, aparentemente, não vêem nenhum problema moral nisso. Não espere encontrar nenhuma reportagem sobre os “PJs”.
Os brados contra a sonegação deixaram de ser feitos pela mídia brasileira quando as empresas aperfeiçoaram o ‘planejamento fiscal’ — uma espécie de sonegação legalizada, mas moralmente imoral.
O dinheiro cobrado da Globo – a empresa ainda pode e vai recorrer, afirma o Radar – é grande demais para que o assunto fique longe do público. A Globo costuma arrecadar 10 milhões de reais com seu programa “Criança Esperança”. Isso é cerca de 0,5% do que lhe está sendo cobrado. Que o caso saia das sombras para a luz, em nome do interesse público – quer a cobrança seja devida ou indevida.
A Inglaterra não apenas está publicando casos de empresas que pagam muito menos do que deveriam, como Google e Starbucks, como, agora, nomeou os escritórios de advocacia mais procurados por corporações interessadas na evasão legal.
De resto, a melhor filantropia que corporações e milionários podem fazer é pagar o imposto devido. O resto, para usar a grande frase shakesperiana, é silêncio.

A conta secreta do propinoduto do PSDB

Documentos vindos da Suíça revelam que conta conhecida como "Marília", aberta no Multi Commercial Bank, em Genebra, movimentou somas milionárias para subornar homens públicos e conseguir vantagens para as empresas Siemens e Alstom nos governos do PS

Claudio Dantas Sequeira e Pedro Marcondes de Moura
Na edição da semana passada, ISTOÉ revelou quem eram as autoridades e os servidores públicos que participaram do esquema de cartel do Metrô em São Paulo, distribuíram a propina e desviaram recursos para campanhas tucanas, como operavam e quais eram suas relações com os políticos do PSDB paulista.
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A CONTA DA PROPINA
Dinheiro para tucanos saiu da “conta Marília” no
Leumi Private Bank, em Genebra, na Suíça
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Agora, com base numa pilha de documentos que o Ministério da Justiça recebeu das autoridades suíças com informações financeiras e quebras de sigilo bancário, já é possível saber detalhes do que os investigadores avaliam ser uma das principais contas usadas para abastecer o propinoduto tucano. De acordo com a documentação obtida com exclusividade por ISTOÉ, a até agora desconhecida “conta Marília”, aberta no Multi Commercial Bank, hoje Leumi Private Bank AG, sob o número 18.626, movimentou apenas entre 1998 e 2002 mais de 20 milhões de euros, o equivalente a R$ 64 milhões. O dinheiro é originário de um complexo circuito financeiro que envolve offshores, gestores de investimento e lobistas.
Uma análise preliminar da movimentação da “conta Marília” indica que Alstom e Siemens partilharam do mesmo esquema de suborno para conseguir contratos bilionários com sucessivos governos tucanos em São Paulo. Segundo fontes do Ministério Público, entre os beneficiários do dinheiro da conta secreta está Robson Marinho, o conselheiro do Tribunal de Contas que foi homem da estrita confiança e coordenador de campanha do ex-governador tucano Mário Covas. Da “Marília” também saíram recursos para contas das empresas de Arthur Teixeira e José Geraldo Villas Boas, lobistas que serviam de intermediários para a propina paga aos tucanos pelas multinacionais francesa e alemã.
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ELO ENTRE OS ESQUEMAS
Ligado aos tucanos, o lobista Arthur Teixeira, dono de offshores
no Uruguai, recebeu recursos da “conta Marília”
O lobista Arthur Teixeira personifica o elo entre os esquemas Alstom e Siemens. Como ISTOÉ já revelou numa série de reportagens recentes, com base nas investigações em curso, Teixeira e seu irmão Sérgio (já falecido) foram responsáveis por abrir as empresas Procint e Constech, além das offshores Leraway Consulting e Gantown Consulting, no Uruguai, com o único objetivo de servir de ponte ao pagamento de comissões a servidores públicos e a políticos do PSDB. Teixeira tinha acesso privilegiado ao secretário de Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, e ao diretor de Operação e Manutenção da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos), José Luiz Lavorente, o encarregado da distribuição em mãos da propina.
Até 2003 conhecido como Multi Commercial Bank, depois Safdié e, a partir de 2012, Leumi Private Bank AG, a instituição bancária tem um histórico de parcerias com governos tucanos. Em investigações anteriores, o MP já havia descoberto uma outra conta bancária nesse banco em nome de Villas Boas e de Jorge Fagali Neto, ex-secretário de Transportes Metropolitanos de SP (1994, gestão de Luiz Antônio Fleury Filho) e ex-diretor dos Correios (1997) e de projetos de ensino superior do Ministério da Educação (2000 a 2003) na gestão Fernando Henrique Cardoso. Apesar de estar fora da administração paulista numa das épocas do pagamento de propina, Fagali manteria, segundo a Polícia Federal, ascendência e contatos no governo paulista. Por isso, foi indiciado pela PF sob acusação de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Fagali Neto também é irmão de José Jorge Fagali, que presidiu o Metrô na gestão de José Serra. José Jorge é acusado pelo MP e pelo Tribunal de Contas Estadual de fraudar licitações e assinar contratos superfaturados à frente do Metrô.
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Para os investigadores, a “conta Marília” era usada para gerenciar recursos
de outras contas destinadas a abastecer empresas e fundações de fachada
Para os investigadores, a “conta Marília” funcionaria como uma espécie de “conta master”, usada para gerenciar recursos de outras que, por sua vez, abasteceram empresas e fundações de fachada, como Hexagon Technical Company, Woler Consultants, Andros Management, Janus, Taltos, Splendore Associados, além da já conhecida MCA Uruguay e das fundações Lenobrig, Nilton e Andros. O MP chegou a pedir, sem sucesso, às autoridades suíças e francesas o arresto de bens e o bloqueio das contas das pessoas físicas e jurídicas citadas. Os pedidos de bloqueio foram reiterados pelo DRCI, mas não foram atendidos. Os investigados recorreram ao STJ para evitar ações similares no Brasil.
O MP já havia revelado a existência das contas Orange (Laranja) Internacional, operada pelo MTB Bank de Nova York, e Kisser (Beijoqueiro) Investment, no banco Audi de Luxemburgo. Ou seja, “Marília” é mais um nome próprio no dicionário da corrupção tucana. Sabe-se ainda que o cartel operado pelas empresas Siemens e Alstom, em companhia de empreiteiras e consultorias, usava e-mails cifrados (leia quadro).
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RELAÇÃO COM FHC
Um dos beneficiários da propina oriunda da Suíça, Geraldo Villas Boas
mantinha uma conta conjunta com Jorge Fagali Neto, ex-diretor de projetos do
Ministério da Educação (2000 a 2003) na gestão de Fernando Henrique Cardoso
Os novos dados obtidos pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça dão combustível para o aprofundamento das investigações no Brasil. Além do processo administrativo aberto pelo Cade sobre denúncia de formação de cartel nas licitações de São Paulo e do Distrito Federal, outras duas ações sigilosas, uma na 6ª Vara Federal Criminal e outra na 13ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, apuram crimes contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro e improbidade administrativa. Além de altos funcionários do Metrô, como os já citados Lavorente e Fagali, as investigações apuram a participação do ex-secretário de Energia e vereador Andrea Matarazzo, em razão de contratos celebrados entre a Companhia de Energia de São Paulo (CESPE) e a Empresa Paulista de Transmissão de Energia Elétrica S.A. (EPTE).
Na documentação encaminhada pelo DRCI ao MP de São Paulo, a pedido do promotor Silvio Marques, também constam novos dados bancários de vários executivos franceses, alemães e brasileiros que tiveram algum tipo de participação no esquema de propinas. São eles os franceses Michel Louis Mignot, Yves Barbier de La Serre, André Raymond Louis Botto, Patrick Ernest Morancy, Jean Pierre Antoine Courtadon e Jean Marcel Jackie Lannelongue e os brasileiros José Amaro Pinto Ramos, Sabino Indelicato e Luci Lopes Indelicato, além do alemão Oskar Holenwger, que operou em toda a América Latina. Na Venezuela, Holenwger é citado junto a Mignot, La Serre, Morancy e Botto em investigação sobre lavagem de dinheiro, apropriação indébita qualificada, falsificação de documentos e suposta corrupção de funcionários públicos do setor de energia.
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DA COZINHA DE COVAS
De acordo com o MP, o conselheiro do TCE, Robson Marinho (foto), homem de confiança
do ex-governador Mário Covas, recebeu dinheiro através da conta Marília 
O apoio das autoridades de França e Suíça às investigações brasileiras não tem sido tão fácil, e a cooperação é mais recente do que se pensava. O Ministério da Justiça chegou a pedir o compartilhamento de informações ainda em 2008 – auge da investigação da Siemens e da Alstom. Mas não foi atendido. Os franceses lembraram que, nos termos do acordo bilateral, a cooperação só pode se desenrolar por via judicial. Dessa forma, foi necessário notificar o Ministério Público Federal para que oficiasse junto à 6ª Vara Criminal Federal e à 13ª Vara da Fazenda Pública. O compartilhamento só foi efetivado em dezembro de 2010.
A Suíça, ainda em março de 2010, solicitou a cooperação brasileira na apuração das denúncias lá, uma vez que parte do dinheiro envolvido nas transações criminosas teria sido depositada em bancos suíços. Os primeiros dados, relativos à empresa MCA e ao Banco Audi de Luxemburgo, chegaram ao Brasil em julho de 2011. Foram solicitadas ainda oitivas com determinadas testemunhas, o que foi encaminhado ao MPF em São Paulo e à Procuradoria Geral da República (PGR). Paralelamente, a Polícia Federal abriu o inquérito nº 0006881-06.2010.403.6181, mas só no último dia 25 de julho o procurador suíço enviou às autoridades os dados bancários solicitados, por meio de uma decisão denominada “conclusive decrees”, proferida em 14 e 24 de junho. Foi com base nisso que a Suíça já bloqueou cerca de 7,5 milhões de euros que estavam na conta conjunta de Fagali e Villas Boas, no Safdié. Tratou-se de uma decisão unilateral suíça e a cifra não é oficial – foi fornecida ao Ministério da Justiça por fonte informal. A Suíça só permite o uso dos dados enviados em procedimentos criminais.
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Fonte - ISTO É

1,3 milhão de livros para download ou leitura on-line

Open Library é um dos projetos mais ambiciosos da internet: pretende catalogar e digitalizar todos os livros já publicados, em todas as línguas. Desenvolvido sem fins lucrativos pelo Internet Archive e pela Fundação Austin, o projeto consiste na disponibilização crescente de livros para catalogação histórica, download legal ou leitura on-line. Atualmente, dos 20 milhões de livros catalogados, mais de 1,3 milhão de títulos estão disponíveis para download ou leitura on-line nos formatos PDF, ePub, Plain text, DAISY, ePub, MOBI e DjVu. Embora a língua predominante seja a inglesa, podem ser encontrados livros em cerca de 50 idiomas.  
O acervo, que reúne obras dos maiores museus, universidades e instituições religiosas do mundo, disponibiliza preciosidades históricas dos séculos 10, 11, 12, 13, 14 15, 16, 17, 18, e 19, entre elas, tesouros literários como “O Códice de Leningrado”, considerado o mais antigo e completo manuscrito do mundo, base do texto da “Bíblia” hebraica, escrito em pergaminho e datado de 1008; a primeira edição impressa da obra capital de Agostinho de Hipona, “A Cidade de Deus”; além de cópias das primeiras edições da obra integral de William Shakespeare.
O projeto também disponibiliza aproximadamente 10 mil títulos, juridicamente protegidos, pertencentes a 350 bibliotecas de 80 países, para empréstimo. Para participar e pegar um livro emprestado, basta se cadastrar. Os livros ficam disponíveis por duas semanas. No caso de download ou leitura on-line, não há necessidade de cadastro.

Como é a vida nas prisões femininas no Brasil

Uma jornalista se especializa no assunto.
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Este texto foi originalmente publicado no site Unisinos
“É internacionalmente reconhecido que o sistema penitenciário feminino brasileiro é inadequado”, afirma a jornalista Nana Queiroz , responsável pelo blog Presos que Menstruam, onde divulga informações sobre o sistema carcerário feminino.
Segundo ela, entre as precariedades das penitenciárias brasileiras, destaca-se o fato de as mulheres terem um tratamento similar ao dos homens, sem acesso à saúde e cuidados com higiene. “O poder público parece ignorar que está lidando com mulheres e oferece um ‘pacote padrão’ bastante similar ao masculino, nos quais são ignoradas a menstruação, a maternidade, os cuidados específicos de saúde, entre outras especificidades femininas”, ressalta na entrevista a seguir, concedida à por e-mail.
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Nana Queiroz
Nana informa que atualmente existem 53 penitenciárias femininas no país, mas muitas mulheres “são mantidas em delegacias de polícia e carceragens superlotadas e com estrutura inadequada”. Segundo ela, as detentas reclamam de acesso à saúde, e narram casos em que “policiais e carcereiros resistiram até o último minuto para levar mulheres em trabalho de parto para o hospital – em alguns casos, as mulheres deram à luz na própria cadeia”. E dispara: “Uma coisa que não lhes falta são ansiolíticos e antidepressivos. É praxe, segundo as detentas, que a administração dos presídios e os médicos responsáveis receitem remédios controlados para mantê-las ‘dóceis’. É muito mais difícil controlar mulheres que tenham crises de pânico, de ansiedade, de depressão (o que é comum de se esperar, dadas as circunstâncias). Mulheres dopadas dão muito menos trabalho”.
Nana Queiroz se formou em jornalismo pela Universidade de São Paulo – USP em julho de 2010. É especialista em Relações Internacionais, com ênfase em direitos humanos, pela Universidade de Brasília – UnB. Estudou relações internacionais também em Nova York e na Finlândia. Trabalhou nas revistas Época e Galileu e como repórter da editoria de internacional no site da revista Veja. No Jornal Correio Braziliense, foi repórter de variedades. Hoje é editora de cultura do Jornal Metro de Brasília. Ela também é responsável pelo blog Presos que Menstruam.
Qual a situação do sistema carcerário feminino brasileiro? Quantas penitenciárias femininas existem no país?
Em 2012, durante a Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o Brasil foi repreendido por desrespeitar os direitos humanos em seu sistema carcerário, especialmente por ignorar questões de gênero. Ou seja, é internacionalmente reconhecido que o sistema penitenciário feminino brasileiro é inadequado. O poder público parece ignorar que está lidando com mulheres e oferece um “pacote padrão” bastante similar ao masculino, nos quais são ignoradas a menstruação, a maternidade, os cuidados específicos de saúde, entre outras especificidades femininas.
É até mesmo difícil dizer exatamente quantos locais abrigam detentas no Brasil hoje, já que muitas delas são mantidas em delegacias de polícia e carceragens superlotadas e com estrutura inadequada Brasil afora. Em dezembro de 2012, porém, um levantamento do Ministério da Justiça apontou que existiam 53 penitenciárias, 4 colônias agrícolas, 7 casas de albergados, 9 cadeias públicas e 5 hospitais de custódia (para presas com problemas mentais) no país.
Qual é o perfil das presas?
Segundo levantamento realizado pelo Ministério da Justiça em 2012, havia, na ocasião, 31.552 mulheres presas no país. Destas, 3.733 tinham Ensino Médio incompleto, 13.584 não haviam completado o Ensino Fundamental, 2.486 tinham sido apenas alfabetizadas e 1.382 eram analfabetas. Só 272 haviam concluído o Ensino Superior. Esses dados mostram que o perfil da mulher presa, hoje, inclui a baixa escolaridade e, como consequência, proveniência de classes mais pobres. Segundo minha pesquisa (que foi qualitativa e não quantitativa) é uma população majoritariamente negra ou mestiça.
O levantamento também confirma uma tese antiga de ativistas da área: depois que as mulheres assumiram a chefia da casa (com seus salários sempre menores do que os homens que ocupam os mesmos cargos), sentiram aumentar também a pressão financeira sobre elas. Isso teria feito com que o número de mulheres presas saltasse de 16.473 em dezembro de 2004 para os atuais 31.552. Não é à toa que a maioria delas é acusada de crimes que serviriam como complemento de renda: 6.697 são detidas por crimes contra o patrimônio e 17.178 por tráfico de entorpecentes.
Como a maternidade e os cuidados com a saúde das mulheres são tratados nas penitenciárias femininas? Elas têm acesso a exames, medicamentos, tratamento médico?
Veja bem, o tratamento de saúde da mulher pobre no Brasil é precário, o que já nos dá uma boa dimensão de como deve ser dentro de uma penitenciária (ou pior, em delegacias e carceragens inadequadas). Logo, essas mulheres, grávidas ou não, chegam às penitenciárias com um histórico bem lamentável de cuidados médicos. Algumas são dependentes químicas, outras grávidas que nunca fizeram o pré-natal, outras se sujeitaram a Doenças Sexualmente Transmissíveis – DSTs. As presas que entrevistei relataram encontrar dificuldades em receber atendimento médico preventivo (como papanicolau, por exemplo).
Também narraram casos em que policiais e carcereiros resistiram até o último minuto para levar mulheres em trabalho de parto para o hospital – em alguns casos, as mulheres deram à luz na própria cadeia.
Agora uma coisa que não lhes falta são ansiolíticos e antidepressivos. É praxe, segundo as detentas, que a administração dos presídios e os médicos responsáveis receitem remédios controlados para mantê-las “dóceis”. É muito mais difícil controlar mulheres que tenham crises de pânico, de ansiedade, de depressão (o que é comum de se esperar, dadas as circunstâncias). Mulheres dopadas dão muito menos trabalho.
E no que se refere à higiene diária? Você mencionou em recente entrevista que as mulheres não recebem absorventes. Pode nos relatar como é a rotina das presas nesse aspecto?
Esse é dos problemas mais patentes. Recebi diversos relatos, tanto em penitenciárias quanto em delegacias, de que não são distribuídos os itens e higiene suficientes. Isso é ainda mais grave para mulheres abandonadas pela família (um grande percentual das detentas). Nestes casos, elas procuram substituir os absorventes por papel higiênico, jornal ou até mesmo miolo de pão enrolado, que serve como um O.B. improvisado. Logo, itens de higiene se tornam moeda de troca dentro dos presídios, tão valiosos quanto cigarros, serviços de manicure e cabelereiro, entre outros.
Que atendimento é disponibilizado para gestantes?
Não consegui autorização para entrar nas penitenciárias próprias para gestantes, logo, o que vou dizer aqui advém de relatos de presas e ativistas. Algumas delas alegam nunca ter visto um ginecologista ou obstetra durante a gestação. Outras contam ter dormido no chão já com gravidez avançada ou com o bebê recém-nascido. Uma delas, a quem chamo de Gardênia em minha pesquisa, relatou ter tido infecção severa nos pontos de uma cesárea depois quando retornou ao presídio, já que tinha que dormir no chão sujo. Ela diz ainda que, depois que médicos receitaram antibióticos a ela, não houve nenhuma preocupação em que tomasse todas as doses recomendadas.
É comum crianças morarem em presídios com as mães até os seis meses, durante o aleitamento materno? Como se dá essa relação entre mães e filhos nas penitenciárias?
A lei diz que sim. É importante ressaltar, no entanto, que trata-se de uma legislação muito recente, sancionada apenas em 2010. Até então, não era claro o direito das mães de amamentar seus bebês (ou dos bebês de serem amamentados pela mãe detenta). Mesmo assim, devido às condições das penitenciárias, algumas mães não conseguem ficar com o bebê durante os seis meses – logo têm pena de sujeitar o filho àquele ambiente nocivo e o entregam a familiares. Ativistas relatam conhecer casos de penitenciárias e delegacias que, não tendo como hospedar crianças, as mandam para instituições ou parentes da presa mesmo antes dos seis meses mínimos de aleitamento materno.
Acho que as crianças nascidas nas prisões são o mais forte argumento dos defensores dos direitos das detentas, principalmente tocante para aqueles que crêem que criminosas não merecem condições mínimas de direitos humanos. Isso porque há inocentes que também pagam essa pena (o mais inocentes que uma pessoa pode ser): os recém-nascidos.
Por que a visita íntima é dificultada para as mulheres nos presídios femininos?
Em minha opinião, e de diversos outros ativistas da área, isso é reflexo do machismo da sociedade brasileira. No sistema carcerário masculino, reina a visão de que o sexo “aplaca a violência do homem” e que nenhum homem é capaz de viver sem essa “necessidade básica”. No sistema feminino, ao contrário, a relação da mulher com o sexo é tabu. Mais: mulheres que sentem essa necessidade são, silenciosamente, consideradas menos dignas.
Há também o problema prático da gravidez. Os diretores de penitenciárias não querem arcar com os gastos extras representados por uma gestação. Ouvi, inclusive, que um delegado sugeriu que só permitiria visitas íntimas às detentas que tomassem injeções anticoncepcionais. Ora, obviamente não é sábio engravidar na prisão. Porém, essa não é uma decisão que caiba ao poder público e sim à mulher, que é dona de seu corpo mesmo enquanto cumpre pena.
As poucas penitenciárias que permitem os encontros íntimos das detentas com seus cônjuges (e é importante dizer que o Estado só entende como cônjuge um homem, logo lésbicas perdem esse direito completamente) enfrentam ainda o problema do abandono. As dificuldades impostas ao relacionamento são tantas que, quando as portas são abertas, são poucos os homens que resistiram e permaneceram fiéis à suas parceiras encarceradas.
Como é a rotina das presas?
Um tédio. Em muitos locais, elas chegam a brigar por vagas de trabalho. A maioria delas gostaria de trabalhar para reduzir o tempo de pena, poder mandar algum dinheiro para a família ou até ocupar o tempo. As ofertas de trabalho, porém, não são suficientes. Algumas se dedicam a ler (elas adoram Drauzio Varella, Zíbia Gasparetto, e romances românticos), e também às suas religiões, que servem de apoio a muitas delas.
Deseja acrescentar algo?
Em um momento em que a sociedade brasileira amadurece para respeitar os homossexuais, acho importante lembrar que essas pessoas têm seus direitos frustrados também no cárcere. O Estado não entende como cônjuge as esposas, namoradas e companheiras de outras mulheres e, por isso, não permitem suas visitas – já que não há grau de parentesco. Assim, muitas mulheres gays são privadas do afeto e apoio de suas parceiras, o que é indispensável para a ressocialização.
É bom frisar, também, que, diante do abandono pelo cônjuge, muitas mulheres que se consideravam heterossexuais previamente, mantêm relacionamentos homossexuais dentro da cadeia. Assim, elas aplacam a solidão e a carência e se apoiam mutuamente. Em muitas ocasiões, esses relacionamentos evoluem para amores sólidos. Quando uma delas é liberta, porém, o relacionamento tem que terminar junto com a pena.
Neste momento, trabalho também em um roteiro de cinema sobre o tema, baseado nas histórias de mulheres que conheci. Se tivermos sorte com os editais, pode haver um “Presos que Menstruam” para cinema. Estamos de dedos cruzados.

Documentário: a violenta realidade dos partos no Brasil

Documentário trata da violenta realidade dos partos no Brasil e revela a importância da humanização do nascimento

Xandra Stefanel, Rede Brasil Atual
parto humanizado brasil renascimento
Imagem / Divulgação / Documentário O Renascimento do Parto
“Até pouco tempo atrás, o amor era assunto para poetas, filósofos e romancistas. Mas hoje em dia, também é estudado por cientistas. Hoje podemos entender que a capacidade de amar é, em grande parte, organizada e construída durante o período em torno do nascimento.” A constatação é do cientista francês Michel Odent no documentário O Renascimento do Parto, que estreia nesta sexta-feira (9) nos cinemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e outras 17 cidades.
O filme dirigido por Eduardo Chauvet, com pesquisa e roteiro de Érica Paula, é um retrato da realidade obstétrica no Brasil e no mundo por meio de entrevistas com médicos, obstetras, doulas e pais que viveram os mais diversos tipos de situação na hora do nascimento dos filhos.
No Brasil, o panorama é alarmante: 50% dos partos são cesarianas, podendo chegar a 90% em alguns hospitais da rede privada. Número bem distante do máximo de 10% a 15% recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Um dos questionamentos que o filme propõe é: o que será do futuro da humanidade se as pessoas continuarem nascendo sem a ocitocina? Há estudos que afirmam que os chamados “hormônios do amor”, liberados apenas em condições específicas de trabalho de parto, são importantes não apenas para conduzir naturalmente a fisiologia do parto, mas também para consolidar o vínculo entre mãe e bebê, o que influi na capacidade deste de amar.
Renascimento do Parto não questiona, porém, a importância da cesariana que, quando indicada corretamente, é responsável por salvar vidas de mães e filhos. A crítica diz respeito ao número excessivo de cesarianas ou partos feitos com intervenções traumáticas e desnecessárias, especialmente em nome de interesses econômicos – o famoso “tempo é dinheiro” na “linha de produção” de médicos e hospitais.
Assista abaixo à reportagem da TVT sobre o filme e o tema
Outro tema abordado é o protagonismo cada vez menor das mulheres. “O médico, homem, tornou-se o ator principal do parto. O produto desse nascimento é o bebê e a mulher é o subproduto, secundário. Para o surgimento do modelo obstétrico contemporâneo, era fundamental que se criasse a ideia de que as mulheres são essencialmente incompetentes e incapazes de dar conta do processo de nascimento por si mesmas”, afirma o obstetra Ricardo Jones.
O ator Marcio Garcia e sua mulher Andréa Santa Rosa contam as suas dolorosas experiências nos partos de cesariana dos dois primeiros filhos e a alegria de verem Felipe, o terceiro, vir ao mundo por meio do parto normal domiciliar. Também participam do filme a antropóloga norte-americana Robbie Davis-Floyd e a parteira mexicana Naoli Vivaner.
Apesar (ou talvez em consequência) do número sem precedentes de intervenções cirúrgicas desnecessárias na hora do nascimento, o documentário mostra o “movimento de retorno”, ou seja, as casas de parto incentivadas pelo governo, a criação de suítes de parto normal pela iniciativa privada e o aumento dos partos domiciliares acompanhados por parteiras treinadas e com formação acadêmica.
O casal Eduardo Chauvet e Érica Paula consegue equilíbrio entre a emoção e a informação médica pura e simples. É tão aflitivo assistir na tela grande a uma episiotomia (corte na região entre a vagina e o ânus) quanto emocionante ver nascer com os bebês os laços afetivos entre mães e filhos.
O filme selecionado pelo Los Angeles Brazilian Film Festival e pelo DocBrasil Festival China deste ano foi feito com recursos dos próprios realizadores e com mais de R$ 142 mil, fruto do maior financiamento coletivo no Brasil feito até hoje.
Filme O Renascimento do Parto
Pesquisa, roteiro e produção: Érica de Paula
Direção de fotografia, som direto e mídias digitais: Rafael Morbeck
Planejamento de som: Marcello Dalla
Trilha sonora original: Charles Tôrres
Montagem, direção e produção executiva: Eduardo Chauvet

Torcida do Corinthians ataca Emerson Sheik após o atacante postar em rede social uma foto dando 'selinho' em amigo.

Emerson dá ''selinho'' em homem e torcida pede sua saída do clube




o texto de Fabio ChiorinoCarta Capital

Não importa a orientação sexual do jogador. Não importa se a foto acima é apenas uma brincadeira entre amigos. Emerson Sheik rompeu a barreira da intolerância, um dos comportamentos mais marcantes do futebol brasileiro. O atacante zombou de todos aqueles que enxergam as relações amorosas tão inflexíveis quanto o 4-4-2 que o técnico insiste em escalar. Sheik, ao dar o “selinho” no amigo, namorado, parente, afim, deu uma voadora na hipocrisia hasteada por torcedores, dirigentes e até mesmo colegas de profissão.

Héteros e gays sempre jogaram no mesmo time, assim como o craque e o perna de pau. Mas nunca foi permitida qualquer manifestação que colocasse em dúvida a “masculinidade” dos jogadores. E formamos uma legião homofóbica que prega apelidos jocosos, expulsa jogadores, torna a discussão necessária em mais um retrocesso.

Na última vez que o assunto veio à tona, o desfecho foi desastroso. Uma declaração infeliz de um dirigente do time rival, e Richarlyson virou inimigo de torcedores do seu próprio clube. Deu entrevista para o Fantástico. Negou ser gay, como quem se defende de uma acusação. Apresentou às pressas uma namorada, capa de revista masculina, e o semblante de puro constrangimento. Um episódio que não trouxe qualquer evolução da mentalidade doentia de uma sociedade que entende o sexo como uma regra de 3.

E claro que já existem centenas de corintianos a pedir a saída de Sheik. Uma turba de imbecis a clamar palavras de ódio. Estão lá apenas para apontar o dedo e dizer quem tem o direito ou não de jogar no Corinthians. Ignoram a liberdade de expressão. Ignoram o respeito. Ignoram a Democracia Corintiana, a vanguarda de um clube absolutamente identificado com as massas populares. Covardes com ingresso numa mão e a estupidez na outra.

Torcida do Corinthians ataca Emerson Sheik após o atacante postar em rede social uma foto dando 'selinho' em amigo.
Foto: Rodrigo Gazzanel/Futura Press/Folhapress

Mas ficam as réplicas sinceras de torcedores de dezenas de clubes, que aplaudiram o drible mais desconcertante da carreira do jogador. Emerson Sheik, que já colecionou páginas de jornais por adotar uma macaca e por se ver envolvido em denúncias de adulteração de documentos e contrabando de carros, hoje ganha todas as atenções por um simples gesto. O beijo. Algo tão comum e universal quanto o futebol.

Terapia se mostra promissora para vítimas de abuso sexual no Congo

Um tipo de terapia de grupo para vítimas de trauma tem mostrado resultados extraordinários para sobreviventes de violência sexual na República Democrática do Congo, permitindo que as mulheres superem a vergonha, os pesadelos e os terríveis flashbacks que as deixavam incapazes de trabalhar, cuidar de suas famílias ou de si mesmas, dizem pesquisadores.


NYT
Mãos de uma congolesa não identificada que diz ter sido estuprada por homens de uma milícia armada que ocupou a cidade de Livungi (foto de arquivo)

O artigo sobre a terapia, publicado no New England Journal of Medicine em junho, é uma notícia rara: o estudo rigoroso mostrou que se podem curar as cicatrizes mentais e emocionais de mulheres em uma parte da África onde o estupro se tornou uma arma de guerra rotineira. O Congo, com duas décadas de guerra civil, é chamada pela ONU da capital mundial do estupro. O país oferece pouco ou nenhum tratamento para problemas mentais.
Uma equipe de pesquisadores das Universidades Johns Hopkins, de Washington e do Comitê de Resgate Internacional levaram ao país um tratamento chamado terapia de processamento cognitivo. Eles adaptaram o método para mulheres que não podem ler, e o ensinaram para trabalhadoras da área da saúde, que estudaram até o nível médio ou nem isso. Essas funcionárias conduziram sessões de terapia em grupo em cinco línguas com sobreviventes de ataques sexuais que sofriam de ansiedade severa, depressão ou estresse pós-traumático. Em suaíli, o tratamento foi chamado de terapia “coração e mente”.
Centenas de milhares de congolesas, de crianças pequenas a idosas – o número talvez chegue a 2 milhões, segundo um estudo – foram estupradas por rebeldes ou soldados do governo. Alguns ataques brutais incluíram estupro em gangue, penetração com armas, facas e outros objetos.
O estudo incluiu mulheres de 15 vilas rurais no leste do Congo, uma área onde cerca de 40% das mulheres foram vítimas de violência sexual. A técnica da pesquisa já havia sido usada com sucesso para vítimas de estupro e estresse pós-traumático nos EUA. Ela envolve ensinar as pessoas a abordar racionalmente pensamentos, sentimentos e crenças perturbadoras que podem permanecer depois de um ataque.
Por exemplo, mulheres violentadas frequentemente culpam a si mesmas. Deixaram uma janela aberta, saíram sozinhas, fizeram contato visual com o homem, estavam vestidas de forma inadequada. A terapia faz com que questionem essas crenças. Mulheres em outras circunstâncias também foram estupradas? Se a resposta é sim, como uma mulher pode se culpar?
O programa é altamente estruturado, as conselheiras têm um manual com tópicos definidos para cada sessão e passam “lição de casa” para as participantes.
Sete vilas, com 157 mulheres, foram escolhidas aleatoriamente para receber a terapia de grupo. Em outras oito outras vilas, com 248 mulheres, foi oferecido “apoio individual”, ou seja, mulheres podiam pedir aconselhamento pessoal.
A terapia em grupo consistiu em uma sessão individual com um conselheiro e 11 encontros semanais de duas horas com o grupo. Os sintomas das mulheres foram medidos três vezes: antes do programa, logo que terminaram e seis meses mais tarde.
A melhora de quem recebeu a terapia de grupo foi admirável, disseram os pesquisadores. Seis meses depois do tratamento, apenas 9% das mulheres que participaram da terapia de grupo ainda apresentavam ansiedade, depressão ou estresse pós-traumático. No grupo de controle, 42% das mulheres ainda tinham os problemas.
Catherine Poulton, conselheira do Comitê Internacional de Resgate, disse que a entidade pretende trabalhar junto ao Ministério da Saúde congolês para oferecer a terapia a mais mulheres através dos centros de saúde. A associação também pretende oferecer o tratamento em outros países que necessitem.
A líder do estudo, Judith K. Bass, professora assistente no departamento de saúde mental da Johns Hopkins, disse: “Não se trata de uma cura miraculosa. Todas essas mulheres não estão correndo para as ruas e dançando. Mas elas podem voltar para a comunidade."
Por Denise Grady - 
Fonte - Ultimo Segundo

Político afirma que Jesus pode ter sido gay e esse seria o motivo de sua crucificação

Político afirma que Jesus pode ter sido gay e esse seria o motivo de sua crucificação
O prefeito de uma cidade na Islândia chamou a atenção da mídia internacional ao afirmar que Jesus pode ter sido um homossexual, pois a Bíblia Sagrada não traz relatos de relacionamentos dele com mulheres.
A fala de Jon Garr se deu num discurso em defesa da prática homossexual, durante a Conferência Internacional sobre Direitos Humanos, na cidade de Antuérpia, na Bélgica.
“O Criador não pode ter nada contra a homossexualidade [...] Até o próprio Jesus poderia ter sido gay, já que não temos nenhuma confirmação de suas relações com mulheres”, disse Garr.
Jon Garr, que comanda a cidade de Reiquejavique, na região mais inexplorada do norte da Islândia, foi além e afirmou que o símbolo do sacrifício de salvação para os cristãos, a crucificação, pode ter sido imposta a Jesus por causa de sua suposta homossexualidade.
De acordo com a agência RÚV, embora Gnarr não tenha esclarecido os motivos de suas conclusões, ele afirmou ter escrito uma carta ao Vaticano sobre o assunto. “Apesar de ter escrito o documento em latim”, disse Garr, “nenhuma resposta foi dada” pela Igreja Católica.
O polêmico prefeito concluiu seu discurso dizendo que os demais prefeitos das capitais europeias deveria seguir o exemplo de sua cidade e priorizar os Direitos Humanos, começando pelas questões ligadas ao movimento homossexual.
Fonte - Gospel +

Cruzada antigay no Haiti mostra perigos da intolerância religiosa


Em menos de uma semana, quase 50 ataques a homossexuais foram registrados pela SEROvie (organização de defesa dos direitos humanos de grupos vulneráveis, incluindo pessoas LGBT), no Haiti. Após divulgar um boato de que haveria no país um projeto de lei para legalizar o casamento gay no país caribenho, a Coligação de Organizações Haitianas pela Religiosidade e a Moral promoveu agressões, incêndios, ameaças e pregação religiosa forte contra homossexuais. Duas vítimas fatais foram registradas durante um protesto no mês passado.

Se dizendo “cristãos anti-gays”, grupos homofóbicos desfilam nas ruas com facões, paus e ferros a procura de homossexuais. A homofobia na ex colônia francesa com aproximadamente 10 milhões de habitantes tem registrado cinco internações por causa da homofobia por dia desde o mês passado. No último dia 19, mais de mil pessoas foram às ruas armadas protestar contra os gays e fazer ameaças públicas de morte aos gays e reafirmar que “Deus” é contra a união gay. O maior protesto, em frente ao Parlamento, no boulevard Jean Jeacques Dessalines, na capital Porto Príncipe, terminou com dois homens mortos a pauladas e desencadeou uma caça aos gays no país que já dura semanas.

O governo já se manifestou contra os ataques e afirmou que os agressores serão levados à Justiça. O presidente do Haiti, Michel Martelly, e o primeiro-ministro, Laurent Lamothe, condenaram os ataques publicamente mas a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) cobra uma posição mais enérgica do país. A CIDH determinou cobrou do país esta semana: "É imperativo que o Haiti tome medidas eficazes para evitar a repetição de tais atos de violência e discriminação no futuro. (...) A Comissão recorda que o Estado tem a obrigação de tomar medidas para responder a estas violações de direitos humanos e garantir que as pessoas LGBT possam efetivamente exercer o seu direito a uma vida livre de discriminação e violência, incluindo a adoção de políticas e campanhas públicas. Neste sentido, a Comissão reitera que a ineficácia na resposta do Estado à violência fomenta a impunidade, que por sua vez estimula a repetição crônica desses crimes, deixando as vítimas e suas famílias indefesas. Além disso, a impunidade para esses crimes envia uma mensagem geral para a sociedade que essa violência é tolerada", afirmou a entidade em documento oficial.

Fonte - Revista LadoA

Não há direitos humanos em favelas e tribos indígenas do Brasil, diz Anistia


Após uma semana de encontros no Brasil, o secretário-geral da ONG Anistia Internacional, Salil Shetty, cobrou o fim da impunidade policial e um maior consistência na proteção aos direitos humanos, afirmando que tanto favelas do Rio quanto comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul parecem ser "zonas francas de direitos humanos".

"É como se essas pessoas não estivessem no Brasil. Lá valem regras diferentes. Elas vivem em zonas de guerra, e todos os direitos humanos estão suspensos", disse o indiano.

Em entrevista à BBC Brasil, Shetty condenou a violência policial, comentou o desaparecimento do pedreiro Amarildo, na Rocinha, e afirmou que a ação da polícia durante as manifestações foi "um alerta para o cidadão brasileiro médio sobre como a polícia atua".
Shetty passou a última semana no Brasil e ouviu relatos de violência de moradores do Complexo da Maré e de comunidades indígenas em Dourados, no Mato Grosso do Sul, onde visitou uma aldeia Guarani-Kaiwoá e se reuniu com lideranças de diversas etnias.
Em Brasília, ele teve encontros com os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, e o secretário-geral da presidência, Gilberto Carvalho.
"Procurei transmitir para eles um sentido de urgência", disse. "Essas comunidades (tanto as indígenas quanto as favelas) estão perdendo a paciência."
Ao encerrar sua visita na sexta-feira, Shetty considerou que o governo tem muitas conquistas das quais deve se orgulhar, citando a redução da pobreza, a desigualdade de renda e a criação da Comissão da Verdade.
Mas disse que o Brasil precisa agir com urgência para proteger seus cidadãos com consistência.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil: Nos últimos meses, tivemos uma onda de manifestações que balançou o país. Na sua opinião, o que esse momento em relação à defesa dos direitos humanos no Brasil?
Salil Shetty: O conceito básico que permeia os direitos humanos é que aqueles no poder precisam prestar contas diante das pessoas comuns. Em muitas democracias, como no Brasil, Turquia e Índia, os líderes tendem a presumir que, eleitos, eles têm legitimidade, e só precisam prestar contas nas eleições seguintes.
Acho que as pessoas no mundo estão dizendo para os líderes que as eleições são o primeiro passo para isso, e não o último. É um processo constante, e se você não cumprir o que prometeu – as pessoas não estão mais apáticas. Elas vão exigir seus direitos. É um sinal muito positivo de certa forma.
Para mim, essencialmente, os protestos foram sobre direitos humanos – sejam direitos econômicos, sociais, civis, políticos. A triste realidade no caso do Brasil, e não foi diferente na Turquia e na Índia, é que a resposta do estado foi uma de repressão. Em parte porque esse país ainda tem uma herança da ditadura em termos do comportamento da polícia.
BBC Brasil: A atuação da polícia durante as manifestações gerou muitas críticas, com denúncias de abuso de poder e prisões arbitrárias. A própria Anistia se pronunciou sobre o uso excessivo da força e de armas não-letais.
Shetty: Paradoxalmente, acho que foi a primeira vez que a classe média experimentou a brutalidade da polícia, porque para moradores de favelas essa experiência é rotineira, assim como para os povos indígenas. O que aconteceu foi infeliz, mas por outro lado foi um grande despertar para o cidadão brasileiro médio sobre como a polícia atua.
BBC Brasil: Na sua avaliação, o que precisa mudar?

Shetty: O país precisa de uma reforma profunda na polícia. Precisa de uma força policial unificada, de um banco de dados e de informações unificado, de um treinamento muito mais sério para o policiamento comunitário – um policiamento que ajude as pessoas, e não as prejudique. E precisa de uma reforma jurídica.
Temos que lembrar que o Brasil tem um dos maiores índices de homicídios violentos no mundo, e uma proporção significativa, de cerca de 20%, são de homicídios cometidos pela polícia.
A questão central é a impunidade. Nós visitamos o Complexo da Maré, onde 10 pessoas foram mortas, inclusive um policial (durante operação do Batalhão de Operações Policiais Especiais, o Bope, em junho). Tivemos o desaparecimento de Amarildo na Rocinha (o pedreiro que sumiu depois de ser levado para a Unidade de Polícia Pacificadora, a UPP, da favela, em 14 de julho).
A Anistia vem levantando esses problemas há muito tempo, e agora eles se tornaram mais visíveis para a mídia e para a classe média por causa dos protestos e do uso excessivo da força.
BBC Brasil: Em muitos casos a polícia argumentou que precisou intervir e dispersar as manifestações para combater a ação de vândalos e a depredação do patrimônio público.
Shetty: Ninguém está falando que o estado não deve conter o vandalismo. É responsabilidade do estado proteger vidas e o patrimônio público. Não é essa a questão. Mas parece haver um consenso no Brasil de que a reação da polícia foi desproporcional nas manifestações. Não se pode usar o vandalismo para justificar ataques a estudantes comuns e a pessoas que estão protestando de forma pacífica.
BBC Brasil: Você se referiu à operação do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) no Complexo da Maré que terminou com dez mortos durante a Copa das Confederações. Como foi sua visita à comunidade?
Shetty: O interessante na Maré é que existe essa expectativa da chegada da UPP, que deve trazer paz, mas as pessoas têm medo dessa "paz". Nós já fizemos uma campanha lá para que os moradores conheçam os seus direitos e saibam como agir se a polícia entrar em suas casas chutando a porta no meio da noite.
O principal problema no combate à impunidade policial é que o sistema atual de investigação é conduzido pela própria polícia. As pessoas não reclamam porque têm medo; ou se reclamam, não há investigação e nada acontece; e se há investigação, ninguém é condenado.
Em Brasília, nossa recomendação (a representantes do governo) foi pela criação de um mecanismo independente de fiscalização de denúncias relacionadas à impunidade policial, que tenha poder investigativo e participação civil.
BBC Brasil: O desaparecimento do pedreiro Amarildo, na Rocinha, mobilizou pessoas em protestos até fora do Rio e se tornou um caso emblemático, embora não seja a primeira vez que algo assim aconteça. Essa mobilização tem a ver com o momento dos protestos, com o fato de ter acontecido em uma favela pacificada?
Shetty: Acho que a mídia se tornou mais consciente e deu mais visibilidade ao caso. E a UPP aumentou a expectativa das pessoas. Se você tem uma UPP, a favela é supostamente pacificada, e o cara entra lá e...
Conversamos com uma sobrinha do Amarildo, a Michele, e ela falou que ele tem seis filhos e que as crianças estão perguntando onde está o seu pai. Ele saiu para comprar limão para preparar um peixe e nunca mais voltou. É uma história dramática que aumentou a compreensão do problema após os protestos, ainda mais com a UPP lá.
E o ponto que ressaltamos com o governo é – vocês vão sediar a Copa do Mundo e a Olimpíada. Vocês não podem ter uma situação em que grandes partes da população do Rio, nas favelas, vivem com tanto medo, intimidação e incertezas. Não pode ser bom para esses grandes eventos. Os protestos que vimos não tiveram muita participação das pessoas das favelas e giravam em torno da Copa das Confederações. Você pode imaginar o que pode acontecer durante a Copa do Mundo.
BBC Brasil: As manifestações durante a Copa das Confederações também denunciavam a violação de direitos humanos no contexto da Copa do Mundo, falando sobre remoções forçadas e questionando as prioridades dos investimentos.
Shetty: Nesses eventos, é essencial dialogar com as comunidades e atentar para suas necessidades, mas aqui já documentamos muitos casos de remoções forçadas relacionadas à infraestrutura para as Olimpíadas.
O Brasil é signatário de diversos tratados internacionais de direitos humanos. O governo federal precisa ter a responsabilidade sobre isso. Não podemos ir cobrar de cada município. Não é o prefeito ou o governador que está assinando o tratado. Se o governo assina, é seu papel resolver todos os processos internos dentro do país.
BBC Brasil: E o país não está fazendo isso?
Shetty: Não, está violando diretrizes da ONU, se você olha para a polícia, para os povos indígenas. O que eu vi nas favelas e nas comunidades indígenas é muito semelhante – ambas são espécies de "zonas francas" de direitos humanos. É como se essas pessoas não estivessem no Brasil. Lá valem regras diferentes. Elas vivem em zonas de guerra, e todos os direitos humanos estão suspensos.
Há 25 anos, o Brasil assegurou que os povos indígenas teriam direito a suas terras tradicionais demarcadas. Agora, 25 anos depois, os Guarani-Kaiowá, os Terena, as outras etnias que encontramos, as comunidades estão perdendo a paciência. Nas favelas também. Em inglês temos um ditado: justiça atrasada é justiça negada. ("Justice delayed is justice denied")
Tentamos transmitir um sentido de urgência aos ministros. Tudo bem, são questões complexas e o Brasil tem um sistema burocrático. Mas por quanto tempo vocês vão continuar dizendo isso?
BBC Brasil: O que o senhor viu na sua visita às comunidades indígenas no Mato Grosso do Sul?
Shetty: Nós visitamos comunidades que foram removidas de suas terras e estão vivendo à beira da estrada. Foi uma visão chocante. Algumas centenas de pessoas vivendo ali, com acampamentos dos dois lados da estrada, muitos casos de crianças mortas por atropelamento. Depois visitamos seus locais de sepultamento. Indígenas mortos por barões de açúcar ou mafiosos.
É uma luta muito desigual, porque os homens (capangas) chegam com armas e carros e eles estão ali à beira da estrada sem proteção nenhuma. A consequência do adiamento da demarcação das terras é que as comunidades indígenas estão sofrendo com violência, intimidação e remoções forçadas.
Falei para os ministros que essa estratégia é de muito alto risco. Continuam pedindo a eles para esperarem, mas eles chegaram a um ponto em que estão prestes a ocupar as terras. E se eles ocuparem as terras, você pode imaginar as consequências.
O Brasil é um país moderno, democrático, com uma sociedade relativamente abastada, está se tornando uma potência mundial. Os direitos humanos básicos têm que estar assegurados.
O Brasil quer ter uma cadeira no Conselho de Segurança (da ONU). É uma reivindicação legítima. Mas se você não tem segurança em uma favela, como vai querer ter um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU? Tem que haver uma correlação entre os dois. Você tem que proteger os seus cidadãos, e isso tem que ser feito de forma consistente.

Fonte - BBC Brasil

Breve história crítica dos feminismos no Brasil

Excluídas da história oficial, as mulheres fazem do ato de contar a própria trajetória uma forma de resistência. Neste ensaio, publicado na...