“Empoderar-se” ou tomar o poder ?

Recentemente, a Rede Globo publicou uma propaganda da Globeleza vestida. Tradicionalmente, ela se apresentava no carnaval nua, apenas pintada, para cobrir-se. Um setor da esquerda pequeno burguesa apresentou uma posição esdrúxula: “A Globo se curvou diante do movimento feminista, é um sinal do empoderamento das mulheres, um grande avanço da luta pela independência da mulher, teremos um ótimo 2017.” Outro setor coloca que o gesto da Globo certamente não mudou nada na condição das mulheres, e tem um caráter extremamente demagógico, ao tentar pintar em melhor luz um bastião do reacionarismo nacional. O caso, ainda que bem trivial, mostrou uma brusca diferença entre as partes, um setor que acredita no “empoderamento dos oprimidos” e outro que acredita que na tomada do poder, na mudança do funcionamento da sociedade para a mudança da mentalidade, um contraste de visão de mundo que há muito precisa ser discutido.
A natureza do poder: físico, material e objetivo
O poder na sociedade atual se mostra todos os dias, é representado pela propriedade dos meios de produção, pelo controle das forças armadas, pelo controle do Estado em geral, pela capacidade de aprovar leis e fazer com que a repressão às aplique. Quem controla essas instituições, controla a sociedade. O mais importante dessas, são os meios de produção, afinal que os controla controla o que acontece na sociedade, controla suas riquezas, a partir destes que a burguesia ergueu seu império, o capitalismo, com o poder vindo destes, controla a política, a imprensa, as forças armadas e a polícia.-
Capitalismo: sistema organizado de opressão
A burguesia usa o Estado contra o seu inimigo natural, o trabalhador. Na luta contra o trabalhador ela está se utilizando de quaisquer atrasos de desenvolvimento, nacionalidades e setores oprimidos historicamente para aumentar seu controle sobre a população. Casos claros como os negros e as mulheres, numa luta contra um dos princípios básicos da própria democracia capitalista: “todos são iguais perante a lei”. Isso não é verdade, na comparação de brancos e negros, os negros estão em uma enorme desvantagem, o mesmo vai para as mulheres, nem autoridade sobre o seu próprio corpo lhes foi dado, como no caso do aborto.
As instituições burguesas propagam a opressão, seja na brutalidade policial, ou na negação de acesso ao ensino superior (como o vestibular), na legislação religiosa (como a do aborto e a proibição das drogas), se traduz no fato de que as mulheres e negros recebem menos pelo mesmo trabalho, e se mostra de maneira grotesca na própria burguesia, onde vemos que das 500 maiores empresas do mundo, apenas 4% dos presidentes são mulheres, negros giram em torno de 1%.
Uma política de privilegiados para os oprimidos.
Falar em “empoderamento” coloca o problema do poder e da opressão de um ponto de vista individual, como se sua solução não dependesse da mudança da sociedade, mas apenas do tomar de consciência de cada um, do “empoderar-se”. Dizer a um escravo “você precisa se empoderar” é absurdo, empoderado ou não, ele continuará dessa maneira até que uma mudança objetiva na relação de escravos e escravagistas mude. Tratar a luta da mulher como se fosse apenas uma luta para definir quais vão ou não ser as vestimentas da Globeleza, ou ainda, tratar a luta do negro como apenas uma luta para definir se ele vai ser chamado de “Negro”, “Preto” ou “Afrodescendente” é uma política de pessoas que não tem em mente as preocupações do povo, as verdadeiras preocupações desses setores oprimidos.
Em suma, não é a consciência que vai determinar a condição ou mudar as condições dos oprimidos. São essas condições e a luta concreta contra elas que elevarão a consciência dos oprimidos.
A luta pela consciência de classe
“O homem é o mundo dos homens”
“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência.”
Karl Marx
Ao mesmo tempo em que dizemos que a opressão é material e que apenas se declarar livre dela não a fará desaparecer, também colocamos, como Marx fez de forma brilhante, que a consciência vem da matéria, do mundo, da sociedade onde ele vive, que as mudanças no mundo levam a mudanças na consciência. Mas, como Marx, vemos que mudanças na consciência levam as classes a mudarem a sociedade, o que por sua vez leva novas mudanças na consciência, num ciclo interminável e permanente, dialético. A luta pela consciência, não dos indivíduos, mas da classe trabalhadora de conjunto e de todos os oprimidos é a luta dos tempos modernos.
Por isso deixamos aos demagogos o “empoderamento”, ao povo é necessário deixar clara a necessidade de lutar para modificar a sociedade, a necessidade de tomar o poder para si, não se contentar ou se comover ao ser “colaborador” ao invés de funcionário, a luta contra a opressão é uma luta contra a demagogia, pelo poder político, para garantir que os oprimidos sejam enfim donos do seu próprio destino.

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