Estatuto do Nascituro foi aprovado na Comissão de Finanças.
De Clara Averbuck
Ainda falta ser aprovado na Comissão de Justiça a no Plenário. Mas não duvido nada que seja. Nunca ouviu falar do Estatuto do Nascituro? Basicamente é o seguinte: um ÓVULO FECUNDADO vai ter os mesmos direitos que eu, que a sua mãe, que a sua irmã e que a minha filha e todas as outras mulheres do Brasil. Se, digamos, minha filha de nove anos fosse estuprada e engravidasse, não teria direito a fazer um aborto; teria de manter o filho do agressor. Se caso não tivesse recursos para sustentar a criança (!!!), o Estado se responsabilizaria com a apelidada BOLSA ESTUPRO até os 18 anos do filho - isso caso o estuprador não fosse identificado e RESPONSABILIZADO. Aborto de anencéfalo? Esquece. Risco de vida pra mãe? Foda-se a mãe. Trauma? Foda-se a mãe.
O aborto ilegal já causa 22% das mortes maternas. Com essa monstruosidade aprovada, é provável que esse número dobre, triplique. Criminalizar o aborto não é solução. Já falei sobre isso aqui.
Se a mãe correr risco de vida e precisar de um tratamento que coloque em perigo a vida do feto, ela será proibida de se tratar. Afinal, a vida de um amontoado de células que ainda não nasceu, não tem personalidade, não tem consciência, é evidentemente mais importante do que a de uma mulher formada.
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Vejamos alguns dos artigos dessa aberração:
Art.1º Esta lei dispõe sobre a proteção integral ao nascituro.
O embrião, você quer dizer. O amontoado de células.
Art. 2º Nascituro é o ser humano concebido, mas ainda não nascido.
Pff.
Parágrafo único. O conceito de nascituro inclui os seres humanos concebidos “in vitro”, os produzidos através de clonagem ou por outro meio científica e eticamente aceito.
Quer dizer, ATÉ UM CLONE é mais importante do que a vida da mãe.
Art. 4º É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar ao nascituro, com absoluta prioridade, a expectativa do direito à vida, à saúde, à alimentação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
SENHORES, NÃO SEI SE VOCÊ SABEM, MAS ELE AINDA NÃO NASCEU.
Art. 9º É vedado ao Estado e aos particulares discriminar o nascituro, privando-o da expectativa de algum direito, em razão do sexo, da idade, da etnia, da origem, da deficiência física ou mental ou da probalidade de sobrevida.
E a mãe que se foda.
Art. 10º O nascituro deficiente terá à sua disposição todos os meios terapêuticos e profiláticos existentes para prevenir, reparar ou minimizar sua deficiências, haja ou não expectativa de sobrevida extra-uterina.
E a mãe que se foda, depois de ter passado uma gestação inteira sabendo que o filho não sobreviveria.
Art. 13 O nascituro concebido em um ato de violência sexual não sofrerá qualquer discriminação ou restrição de direitos, assegurandolhe, ainda, os seguintes:
I – direito prioritário à assistência pré-natal, com acompanhamento psicológico da gestante;
II – direito a pensão alimentícia equivalente a 1 (um) salário mínimo, até que complete dezoito anos;
III – direito prioritário à adoção, caso a mãe não queira assumir a criança após o nascimento.
Parágrafo único. Se for identificado o genitor, será ele o responsável pela pensão alimentícia a que se refere o inciso II deste artigo; se não for identificado, ou se for insolvente, a obrigação recairá sobre o Estado.
Quer dizer: se uma menina for estuprada pelo próprio pai e engravidar, ela é encorajada a carregar o filho/irmão, parir, criar e ainda ter que lidar com o pai de ambos, ou colocar o filho para adoção, como se os orfanatos fossem lugares bacanérrimos, como se o processo de adoção fosse algo fácil, como se isso tudo tivesse alguma conexão com a realidade. Se uma mulher for estuprada por desconhecido, até parece que vão caçar o cara para que ele dê pensão. Não sei o que é pior, o Estado oferecer a pensão ou sugerirem que o ESTUPRADOR pague pensão. Ele deveria estar preso, não deveria? Se encontrado, o estuprador não seria preso, mas obrigado a sustentar um filho? Vão querer visita obrigatória também? É completamente fora da realidade. Completamente. É de uma falta de empatia que eu nunca vi nessa vida. Fazer uma mulher a carregar o fruto de uma violência é acabar com a vida dela. Ou seja, mais uma vez: FODA-SE A MÃE.
É basicamente isso que diz o Estatuto do Nascituro: foda-se a mãe, foda-se a mulher que sofreu violência, foda-se a vida delas. O que importa é a vida que foi gerada.
E isso é baseado em que, mesmo?
Crenças. Crenças de que DEUS mandou essa vida. Gente, olha só, eu sou atéia, eu não tenho DEUS ALGUM. Se você tem um deus e ele não quer que você aborte, apenas NÃO ABORTE.
Mas tire as suas idéias, as suas crenças e essa violência toda do corpo das outras mulheres. Das mulheres. De todas as mulheres.
O Estado não pode mandar em nossos corpos.
Aqui tem um do queridíssimo Pedro Munhoz (com adendo)
Não podemos aceitar. Não podemos nos calar. Não podemos deixar que os fundamentalistas religiosos tomem assim esse país.
O
ESTADO
DEVE
SER
LAICO.
Se não lutarmos por isso, se não fizermos barulho, retrocederemos mais e mais e mais até, sei lá, não podermos usar energia elétrica ou remédios.
Conto com vocês pra fazer um escarcéu.
ADENDO:
Me foi informado que o Estatuto do Nascituro bate de frente com o artigo 128 do Código Penal, que permite o aborto em caso de estupro ou de risco de vida da mãe. Então, ou os nascituros são como a gente e o artigo 128 não vale nada - não duvido que metam a mão no código penal: o projeto original, inclusive, faria isso -, ou a equiparação de pessoas nascidas com o nascituro não faz sentido. De qualquer forma, o Estatuto está linkado para quem quiser ler ali em cima. E sim, eu sou a favor da descriminalização do aborto até a 12a semana, como sugere o Conselho Federal de Medicina, sou a favor do uso de células-tronco, sou a favor da autonomia total do corpo da mulher. O Estado não tem que se meter em nossos úteros.
ADENDO II:
Esse texto trata sobre a versão original do Estatuto do Nascituro, de 2007. Eu não inventei nada do que está escrito. Porém a que está tramitando teve algumas alterações importantes, mantendo o artigo 128 do código penal, mas ainda absurda. Um embrião congelado fora do útero ter os mesmos direitos do que um ser humano nascido, encorajar uma vítima de violência a manter o filho e ainda chamar o agressor de "pai", essa idéia de que adoção é algo plausível e fácil, isso tudo continua sendo completamente fora da realidade, sem mencionar a ausência da autonomia da mulher sobre seu próprio corpo. Não vou mudar o post porque o Estatuto é cheio de brechas e é nessa primeira versão que querem chegar: a criminalização do aborto em TODOS os casos. Os links continuam lá em cima, da primeira versão do Estatuto, de 2007, e do substituitivo, de 2010.
Sugiro também o texto do Sakamoto e da Nádia Lapa.)
Fonte - cebes
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