Uma menina de 11 anos era abusada sexualmente pelo seu pai. Durante os abusos, ele a chamava de “seu pedacinho de merda” . Outra vítima de estupro ouviu do seu algoz “você é a criança má, não eu. Lembre-se que foi você que começou [provocou] isso”. Uma terceira lembra de, durante os abusos sexuais, ouvir “Pare de fingir que é um ser humano”.
Em comum, além do crime, há a desqualificação da vítima. Ou bem ela não é gente, um pedaço de merda, ou o crime teria sido incitado, provocado, por aquelas que foram abusadas.
Não basta a violência sexual sofrida, tem que destruir a subjetividade da vítima. Tem que afirmar, categoricamente, que ela merece todo o sofrimento e abuso sofrido, afinal é “uma merdinha” que “provocou”.
Até entendo o estuprador fazer isso. Mecanismo de dominação e auto-indulto. Ao negar ao outro ostatus de humano, faz deste um mero objeto “legítimo” de suas vontades sádicas.
Ao dizer que a vítima mereceu porque provocou, porque, na verdade, ela queria ser mesmo estuprada, violada, inverte a situação: a culpa é da vítima, é ela a criminosa, que age com ardil espalhando libido.
É normal e compreensível o estuprador agir assim, distorcer a realidade o torna não-responsável pelo seu desejo, objetifica a vítima e o exime de culpa. Violenta a vítima DUAS vezes: física e simbolicamente.
Mas e quando isso é dito por outras pessoas que não o criminoso?
E quando uma jornalista de um grande veículo escreve coisas como “É claro que o ideal é que as meninas sejam respeitadas, mas, para isso, é preciso também que elas ajudem”, ou “quem se vestir de maneira mais provocante vai correr mais risco de ser desrespeitada“??
Aí, caros, estamos no que os ingleses chamam de “rape culture”, ou “cultura do estupro”.
Esta cultura é a face mais visível e violenta do machismo. Ela normaliza a dominação, tolera a violência contra a mulher, naturaliza a homofobia e acaba por justificar o estupro.
Danuza Leão usa da mesma lógica do estuprador. Ao responsabilizar, ao menos em parte, a mulher e suas roupas “provocantes”, Danuza reforça uma cultura machista e violenta que vitimiza milhares de pessoas ao ano, e joga água no moinho do senso-comum.
Não, Danuza. A culpa não é das vítimas, dos seus comportamentos e muito menos das roupas que usam. É de uma sociedade moralista, violenta e machista. E de quem a justifica.
A culpa, minha cara, é também da senhora.
Fonte - Yahoo noticias
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